Ainda que – divergindo dos extraterrestres idealizadores da cerimônia surreal – o próprio Galvão Bueno tenha demonstrado sobriedade ao declarar: “... Não me sinto merecedor dessa homenagem”. E, embora eu concorde plenamente com ele, nada pode ser feito para curar a cegueira crônica de nossos políticos. Agora, mesmo sem desejar, Galvão Bueno tem a chave da Cidade, ao passo que muitos soteropolitanos, sequer têm as chaves de suas casas. Resta-nos apenas, celebrar a incoerência humana.
VAMOS CELEBRAR A ESTUPIDEZ HUMANA. A ESTUPIDEZ DE TODAS AS NAÇÕES.
O MEU PAÍS E SUA CORJA DE ASSASSINOS, COVARDES, ESTUPRADORES E LADRÕES...
VAMOS CELEBRAR A ESTUPIDEZ DO POVO. NOSSA POLÍCIA E TELEVISÃO
VAMOS CELEBRAR NOSSO GOVERNO E NOSSO ESTADO QUE NÃO É NAÇÃO...
CELEBRAR A JUVENTUDE SEM ESCOLAS, AS CRIANÇAS MORTAS. CELEBRAR NOSSA DESUNIÃO...
...VAMOS CELEBRAR NOSSA TRISTEZA. VAMOS CELEBRAR NOSSA VAIDADE...
VAMOS COMEMORAR COMO IDIOTAS A CADA FEVEREIRO E FERIADOTODOS OS MORTOS NAS ESTRADAS. OS MORTOS POR FALTA DE HOSPITAIS...
VAMOS CELEBRAR NOSSA JUSTIÇA, A GANÂNCIA E A DIFAMAÇÃO
VAMOS CELEBRAR OS PRECONCEITOS, O VOTO DOS ANALFABETOSCOMEMORAR A ÁGUA PODRE E TODOS OS IMPOSTOS
QUEIMADAS, MENTIRAS E SEQÜESTROS...
NOSSO CASTELO DE CARTAS MARCADAS... O TRABALHO ESCRAVO... NOSSO PEQUENO UNIVERSO
TODA A HIPOCRISIA E TODA A AFETAÇÃO, TODO ROUBO E TODA INDIFERENÇAVAMOS CELEBRAR EPIDEMIAS. É A FESTA DA TORCIDA CAMPEÃ...
VAMOS CELEBRAR A FOME, NÃO TER A QUEM OUVIR, NÃO SE TER A QUEM AMARVAMOS ALIMENTAR O QUE É MALDADE, VAMOS MACHUCAR O CORAÇÃO...
VAMOS CELEBRAR NOSSA SAUDADE, COMEMORAR A NOSSA SOLIDÃO...
VAMOS FESTEJAR A INVEJA, A INTOLERÂNCIA, A INCOMPREENSÃOVAMOS FESTEJAR A VIOLÊNCIA E ESQUECER A NOSSA GENTE QUE TRABALHOU HONESTAMENTE A VIDA INTEIRA E AGORA NÃO TEM MAIS DIREITO A NADA...
VAMOS CELEBRAR A ABERRAÇÃO DE TODA A NOSSA FALTA DE BOM SENSO, NOSSO DESCASO POR EDUCAÇÃOVAMOS CELEBRAR O HORROR DE TUDO ISTO COM FESTA, VELÓRIO E CAIXÃOTÁ TUDO MORTO E ENTERRADO AGORA. JÁ QUE TAMBÉM PODEMOS CELEBRARA ESTUPIDEZ DE QUEM CANTOU ESSA CANÇÃO...
PERFEIÇÃO – RENATO RUSSO