DE REPENTE os olhos bem abertos. E a escuridão toda escura. Deve ser
noite alta. Acendo a luz da cabeceira e para o meu desespero são duas horas da
noite. E a cabeça clara e lúcida. Ainda arranjarei alguém igual a quem eu possa
telefonas às duas da noite e que não me maldiga. Quem? Quem sofre de insônia? E
as horas não passam. Saio da cama, tomo café. (...)
E o que se passa na luz acesa da sala? Pensa-se uma escuridão clara.
Não, não se pensa. Sente-se. Sente-se uma coisa que só tem um nome: solidão.
Ler? Jamais. Escrever? Jamais. Passa-se um tempo, olha-se o relógio, quem sabe
são cinco horas. Nem quatro chegaram. Quem estará acordado agora? E nem posso
pedir que me telefonem no meio da noite pois posso estar dormindo e não
perdoar. Tomar uma pílula para dormir? Mas e o vício que nos espreita? Ninguém
me perdoaria o vício. Então fico sentada na sala, sentindo. Sentindo o quê? O
nada. E o telefone à mão.
Mas quantas vezes a insônia é um dom. De repente acordar no meio da
noite e ter essa coisa rara: solidão. Quase nenhum ruído. Só o das ondas do mar
batendo na praia. E tomo café com gosto, toda sozinha no mundo. Ninguém me
interrompe o nada. É um nada a um tempo vazio e rico. E o telefone mudo, sem
aquele toque súbito que sobressalta. Depois vai amanhecendo. As nuvens se
clareando sob um sol às vezes pálido como uma lua, às vezes de fogo puro. Vou
ao terraço e sou talvez a primeira do dia a ver a espuma branca do mar. O mar é
meu, o sol é meu, a terra é minha. E sinto-me feliz por nada, por tudo. Até
que, como o sol subindo, a casa vai acordando e há o reencontro com meus filhos
sonolentos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário